29 agosto 2011

Loucura de Dormir


É este um dos problemas da noite... É por isto que ganhei o gosto pela vida na noite... A noite, em que gostava de dormir... A noite, em que odeio dormir.
Quando durmo, durmo pouco. Não consigo dormir as horas recomendadas. No entanto, chega para produzir algo durante o dia seguinte. Produzir mais do que aqueles que dormem as 8 horas. Mas quando durmo, confortável, algumas horas a mais, sonho. E os sonhos costumam ser loucos. Loucos ao ponto de me fazerem rir da loucura que foi. Loucos de me fazerem querer chorar por me recordarem o que tentei durante tanto tempo esconder, tentar não mostrar...
Não choro. Não mais. Choro... Simplesmente não deito as lágrimas escondidas e secas de tanto tempo guardadas... Mas guardo tudo dentro de mim. Dentro de uma caixa trancada, que vou transportando todos os dias comigo, passeando o passado no meu presente, sem que se altere nada, sem que entre em contacto com ele.
Mas quando durmo e os sonhos se tornam de tal forma loucos, sem ser capaz de ter qualquer controlo, essa caixa pode abrir-se e deixar sair o que mais receio. Entra em contacto com os meus pensamentos presentes, atrofia-me o cérebro, deixa-me ficar mais louco e a noite torna-se dolorosa. E o dia torna-se mortífero.
Mas não morro, não. Por mais louco que fique, consigo equilibrar o meu estado de espírito. Consigo-o com consequências, mas consigo-o. E neste momento, por mais louco que esteja, por mais falta de sanidade que exista dentro de mim, tenho uma vontade de viver. E é apenas essa vontade que me faz estar aqui. Vivo. Fisicamente e mentalmente. Emocionalmente... Talvez nem tanto, pois fechei essa caixa. Pelo menos aquela que tem um passado de rosas. Aguardo o dia em que as minhas lágrimas interiores se tornem ácidas e acabem por matar todas essas rosas. Que matem completamente o que tenho cá dentro. Não bastam os picos, pois as próprias pétalas magoam. Que morram! Que dêem espaço a plantas mais belas no futuro...

23 agosto 2011

Aventura Infernal: A Estação

Este é o segundo capítulo da saga "Aventura Infernal". Se ainda não o fizeste, lê o primeiro aqui: http://infinitohorizontal.blogspot.com/2011/07/aventura-infernal-comboio-do-inferno.html



Uma estrela negra aquece este espaço isolado. Pergunto-me... Como pode haver uma estrela aqui... Tão fundo... Onde estou mesmo? O Inferno pode ter estrelas? Como pode ter o Inferno uma estrela, que existe no céu, onde supostamente seria o Paraíso? Talvez alguém me explique por aqui...
Não há ninguém. Não há sombras... Há! Não... Não sei o que acabei de ver. Uma mancha negra moveu-se no solo. Foi tão rápido que não percebi o que era. Teria passado algum animal? Voador? Olho ao... “céu” mas encontro-o vermelho, sendo que as únicas manchas são os diferentes tons de vermelho, causados pela estranha estrela.
Volto a dar uma olhadela para o solo arenoso, mas continuo sem ter notícias de qualquer movimento. Decido caminhar até à estação que se depara à minha frente. Arrepio-me um pouco ao observar os ossos humanos de perto, alguns ainda com pedaços de carne, outros já comidos e lambidos de alguma forma.
Atravesso uma pequena ponte instável de madeira podre. Em cinco passos seria ultrapassada, mas fico no meio e observo a lava a escorrer por baixo de mim. Imagino-me a cair e ver o meu corpo derreter como manteiga, deixando um fuminho a carne assada, mas rapidamente transformado em queimado e o meu corpo não seria mais do que alguns minerais no mundo... Ou no Inferno.
Volto a mim e continuo até ao estabelecimento, que até ao momento me parece deserto. O único som que ouvi desde que saí do comboio foram as vibrações do calor. Devo estar nalgum deserto...
Ao tocar na porta de entrada, que se encontrava inclinada praticamente vinte graus para a direita, esta cai-me sobre os pés, pesada, de uma madeira antiga e com pó. Solto um pequeno uivo de dor, mas rapidamente me dobro para levantar aquele peso morto. Não há luzes, não há vida. Acabo por entrar às escuras e o calor intensifica-se. Oiço agora o som dos meus passos, que por pouco não devem esmagar o chão, tão frágil que está agora. Mais madeira podre...
Exteriormente é um edifício pequeno, de um andar apenas, sendo possível ir apalpando por dentro, mesmo sem qualquer luz. Os meus olhos já estão um pouco mais adaptados à sua ausência. Mais um ponto a favor.
Começo por me aproximar da fonte de calor, seguindo o sentido mais quente. Após alguns passos, apercebo-me que estou junto desse coração. Aos apalpões tento procurar algo. Num dos toques dou um pulo. Queimei-me! Tiro a t-shirt e dobro-a, calço-a como uma luva e tento perceber no que me queimara. Com a ajuda do tacto e da visão melhorada, apercebo-me de uma porta, pequena, ainda quente. Puxo-a, por forma a abri-la. A força já vai no limite, mas não se abre. Continuo a exercer força, pensando se será precisa alguma chave e neste momento...
A porta abre-se e saem gritos de dor de dentro dela. Tapo os ouvidos, pois os gritos rebentariam com os meus tímpanos, se não o fizesse... Pararam agora e mesmo assim sinto um zumbido...
Apercebo-me do clarão espontâneo. A porta era de uma fornaça, acesa ainda, e iluminou toda a área. Posso ver agora tudo... Posso ver as cruzes ensanguentadas, as forcas penduradas no tecto... Estranho... As forcas parecem ter alguém pendurado, mas não vejo nada. Olho para o chão... Vejo uma sombra... Move-se ligeiramente... Os meus olhos deixam de mexer ao mesmo tempo que a mancha negra. Algo perturbador...
Tento analisar melhor o estabelecimento e apercebo-me das consequências das minhas acções... As cordas das forcas estavam ligadas à porta da fornaça... Quando a abri, parece que activei a engenhoca... Mas não vejo ninguém... Louco por perceber, olho para as cruzes, ensanguentadas e sem ninguém. Também uma sombra se encontra abaixo delas. Aproximo-me e, ao afastar-me da fornaça, que queima o som com chamas ruidosas, consigo agora ouvir um borburinho. Aproximo-me mais, mais, mais... Uma voz parece vir das cruzes... Um gemido de dor... A agonia começa a encher esta divisão única. O som torna-se mais intenso e o eco dos gritos doloridos entra e sai constantemente na minha cabeça. Sem aguentar mais, corro para fora, a suar, louco de incompreensão.
Que se passa?

22 agosto 2011

Um Sonho Final


A velhice acaba por chegar, em princípio, espero eu, esperam todos. Alguns...
A morte, essa, é certa. Mais certa do que a velhice. Falo da morte física.
Mas o que é morrer? Fisicamente é óbvio: o corpo deixa de ser capaz de se mover por si mesmo, não é capaz de produzir nada, enfim.
Há quem fale na memória... Só morremos quando nos esquecemos. Então... Se nos lembrarem para sempre, seremos imortais. Ou, pelo menos, viveremos mais tempo. A memória de nós existirá para além da nossa morte física.
Porém, quando o nosso corpo já mal se aguenta, é normal ocorrer uma questão: fiz tudo o que queria? Concretizei os meus sonhos? Fiz algo por eles? E a resposta poderá deixar um morto feliz ou triste.
Eu já fiz essa questão a mim mesmo. Sou jovem, mas tentei imaginar-me velho e a morrer. Óbvio que não consigo imaginar-me completamente. Sinceramente, nem me imagino mortal. Existe uma sensação de imortalidade dentro de mim. Talvez por ser jovem.
Não consigo responder neste momento. Como posso? Não sei o que terei conseguido fazer até lá. Mas fez-me pensar no que gostaria de ter feito quando chegasse o momento. E comecei a sonhar.
Sonhar dá-nos ideias. Através de sonhos conseguimos construir algo usando-os como base. Ou será o contrário? Através de algo que vemos construimos sonhos. Sinceramente parece-me que seja um pouco dos dois. Primeiro vemos o mundo, sonhamos com algo diferente, concretizamos um pequeno sonho e queremos mudar algo mais e voltamos a sonhar mais alto.
Falo por mim quando digo que a vida é feita de pequenos sonhos que se vão criando ao longo dela. Sonhos que num momento podem não ter nada em comum, mas que no final tudo se encaixa e nos torna quem realmente somos. Quero morrer a sentir que completei o encaixe entre todos os meus sonhos.
Então surgiu-me um sonho, grande, complexo e simples, feito de todos os meus sonhos: o sonho final de uma vida: da minha vida. Sempre desejei deixar uma marca, tornar-me uma memória. Uma boa memória. Um exemplo. Portanto o meu sonho final iria inspirar as pessoas.
Passando a uma pequena descrição dele:
Num terreno no meio do nada, onde por algum motivo as pessoas nunca tenham habitado ou se tenham ido embora, iria ser construído tudo. Teria de ser um terreno grande, suficiente para uma espécie de palácio, um espaço verde exterior e um extra.
No interior desse palácio, iriam estar várias salas para cada uma das áreas do mundo, para as artes. Cada uma teria um pouco de tudo do que há de melhor em cada área. Existiria uma sala para cada um dos meus sonhos, concretizados e por conretizar, e os sonhos de outras pessoas que me tivessem cativado. Todas as salas estariam construídas de uma forma totalmente organizada, de forma a criar um simbolismo escondido no meio de tudo e nas pontas isoladas. Nada do que fosse construído seria por acaso: haveria sempre algum significado. Os ornamentos das portas e das paredes, a cor das janelas, as coordenadas de determinado objecto, enfim.
No exterior, seria reproduzido o melhor da Natureza: as mais belas plantas do mundo, as espécies animais mais raras, os efeitos mais fantásticos criados pelos diferentes climas. Novamente, tudo seria colocado de uma forma organizada, sempre com algum significado por trás.
Por fim, haveriam caminhos, grutas, tudo o que pudesse surgir na minha mente, que iriam acabar por fazer ligações entre o palácio e o exterior e até a outros locais especiais.
O objectivo seria cativar os sentidos primeiramente. Posteriormente, quem visitasse este local, sentir-se-ia obrigado a perguntar “porquê?”: entraria na fase de reflexão. Acabaria por tirar conclusões com a maravilha de tanta coisa. Esperançoso, iria criar um estímulo suficiente para seguir os seus sonhos ou até para criar novos sonhos.
De uma forma simples, este é o meu sonho final. Mesmo que não chegue lá, talvez inspire alguém a fazer algo idêntico.

21 agosto 2011

Globos de Água


Um pequeno globo de neve. Quem nunca agitou um?
Uma pequena bola que se pega com a mão e, quando se agita, a neve em repouso no chão, movimenta-se para cima e para baixo, como que se nevasse no pequeno globo.
Uma coisa tão pequena e simples mas que deixa tantas pessoas interessadas em agitar, pelo puro prazer de verem os floquinhos cairem. Outros simplesmente olham para os flocos como uma memória de algo.
Mas... E se um globo fosse do tamanho de um berlinde? E se tudo o que nele estivesse diminuísse tanto quanto o globo diminuísse? Apenas os mais atentos seriam capazes de observar a neve cair...
E se... A neve se transformasse em água da chuva. Em vez de nevar chovesse num pequeno globo transparente. Nem todos os que antes eram atentos conseguiriam observar o seu interior.
Uma pequena esfera vazia, seria a observação de quase todos (se não todos). No momento em que alguém pegasse na esfera, tentaria abaná-la com esperança de ver algo. Não correspondendo às suas espectativas, jogá-la-ia fora, como que se merecesse ir para o lixo, sem qualquer direito de existir. Mas a chuva iria cair. E ninguém iria reparar.
Os meus olhos são como esta pequena esfera. Tornaram-se recentemente esferas isoladas, sem libertar quaisquer gotas de chuva. Um mundo completamente fechado, em que só a minha mente consegue compreender.
Muitos vêm agitar este mundo. Antes poderia escorrer um pequeno rio pela minha face, de felicidade ou tristeza. Hoje chove por dentro, num ciclo único da água, e ninguém se apercebe do que se passa.
Vão-se embora sem procurarem melhor, sem observarem melhor, sem me olharem nos olhos, sem me tentarem conhecer. E nos pequenos globos de água, o ciclo volta a repetir-se: chove.

14 agosto 2011

Mente Só de Sentidos


Olhos no mundo.
As lágrimas de nada servem. Apenas tornam a matéria castanha mais fluida, alastrando-se aos pontos mais escondidos, infectando toda as arestas da bola perfeita.
Olhos secos observam o mundo.
Olhos negros, emanando luz, cegos da visão, nutridos de ilusão.
Viajo na loucura da impossibilidade da perfeição. Repouso nos seios da lixeira do Universo.
Viajo. Repouso.
Viajo enquanto repouso.
A mente desenvolve-se sem os cinco sentidos. Não entra em contacto com o espaço e repousa. Permanece sóbria de estrume que não serve para fazer crescer e, sem qualquer adubo, cresce sozinha, mais do que nunca, guardando os sentidos num lugar especial, sem qualquer cadeado, pois o mundo não procura os meus sentidos: afasta-se deles porque tem medo de os enfrentar.
Mas a mente desenvolve-se com os cinco sentidos. Simplesmente estão escondidos para não afectarem em demasia. Os sentidos matam certos raciocínios. Metem medo. E a mente esconde-se e fica confusa. Mente a mente à mente. E o mundo desmentaliza-se no interior de algo direito.
Por isto, se escondem sentidos.
Por isto, observo com os olhos cegos.
Por isto, esmurro o nariz para se encher de sangue e sentir o odor do meu sangue enquanto me encontro no meio do lixo.
Por isto, fecho a boca enquanto saboreio o pó deixado pelo ácaros que o mundo deixou aparecer.
Por isto, rasgo os meus neurónios para poder sentir o mundo.
Por isto, encho os tímpanos de luz de cheiro para ouvir o vento passar com a palavras sem valor.
Por isto, talvez chegue a algum lado.

07 agosto 2011

O Sonho



São passos. Pequenos passos, grandes passos. Mas são passos. Pluralmente longe do singular. Multiplicações do que é uno, somas do que é multiplicado. Os menos não se tornam mais e os mais não são positivos. O que é agora amanhã será diferente. Ou talvez não. O que é feito agora terá consequências no futuro: bom, mau, bom, mau, bom, mau... Bom e mau. Nada é simplesmente bom. Nada é simplesmente mau. Não há sorte nem azar.
Somos oportunistas. Tudo não passa da escolha das opções e de agir sobre elas. Ou não agir, se a opção for essa. Nunca existe apenas um caminho possível. Mas apenas uma escolha existe. Por mais que se escolha uma estrada, se se voltar atrás não se estará a voltar atrás no tempo e o rasto da passagem irá estar sempre presente de alguma forma. Se se voltar atrás no tempo, também uma marca irá ficar no tempo. Tudo o que for feito será de cada um. As responsabilidades caem sobre a atitude de cada um perante cada situação. Há que assumi-la. Em vez de serem culpabilizados os outros pela miséria, há que agir em nome próprio em vez de se ficar a chorar à espera que nasça felicidade de cada lágrima.
Neste mundo é raro aquele que estica a mão ao outro em qualquer ocasião. Mas é importante que se aprenda a oferecer. Ainda assim, torna-se ainda mais importante que se seja capaz de viver sozinho, quando o mundo parece que atormenta as nossas acções, tentando levar a nossa vida mental no caminho da morte. Não pode ser. Há que estar preparado. Há que estar preparado para a traição e para o abandono. Para viver sozinho num quarto escuro e mesmo assim criar luz nesse quarto. Há que saber acreditar em si mesmo e continuar a lutar pelos seus sonhos, mesmo quando nada parece estar certo. Porque até que o coração deixe de bater, até que os pulmões deixem de fazer inspirar e expirar, até que o corpo não consiga mexer uma única célula de acordo com o pensamento e a força de vontade de cada um, será possível chegar a um sonho, passo a passo, mais curto, mais longo.
Somos nos que agimos conforme os nossos desejos. Se o desejo é lutar, então lutamos; se o desejo é morrer, então morremos. Ninguém lutará tanto quanto nós podemos lutar pelo nosso sonho. Por isso mesmo há que trabalhar por ele. Há que agir.
E o que é um sonho? Um sonho, digo eu, é a morte da vida. Quando estamos a morrer, pensamos no que fizémos ao longo da vida até esse momento. Fizémos coisas boas? Orgulhamo-nos de nós mesmos? Ficámos parados ou démos passos? Quantos passos? Quão perto nos aproximámos de conseguir aquilo? E a outra coisa? Conseguimos? Conseguimos! E aquilo? Conseguimos! E aquilo?! Estivémos quase! Porquê?! Talvez por não o termos feito da melhor maneira... Mas tentámos? Sim! Tentámos mesmo?! Da forma que achámos melhor! Então há que morrer com um sorriso na cara e acreditar que vivemos bem, pois agimos conforme o que queríamos.
Por vezes o produto não depende apenas da nossa força de vontade, mas também da dos outros. Nestes casos, a nossa força serve para conseguir seguir em frente e realizar o nosso sonho.