03 janeiro 2015

Palavra Perdida



Primeira palavra, para que saísses e ficasses, doloroso foi. Do pensar que te querias formar. Da escuridão a que te tentaste agarrar. Palavras formadas em formato de reflexão que desapareciam. Ideias soltas que se agarraram em caminhos de íris cheia, mas que se acabaram a desabraçar-se por se quererem formar.

Irónico… Irónico como as últimas que proferi, que consegui transformar, me esboçavam a desejar acções, a ultrapassar a palavra, superar o dito pelo feito. E agora… Agora custa assim começar a escrever. E acções? Não, nada disso. Muito longe estou disso. Um sentimento de voltar atrás. Ou talvez nem isso. Não sei se alguma vez vivi em tal estado.

Mas é certo que escrevo. É certo que superei algo. Devo eu ficar feliz com isto? Devo esboçar um sorriso por saber que fui capaz de voltar a fazer algo eu fazia antes? Algo que abandonei, a que fraquejei… E que no entanto, pode não passar de uma volta temporária… Palavra agora que silencia mais tarde…

É interessante que escrever passou a ser acção. Era algo natural, considerado instinto para mim. Era expressão do pensamento, do sentimento, da imaginação… Era algo que não precisava de séria construção.

A certo momento precisei de esforçar a escrita... Quis desenhar uma letra, carregar num botão. Tudo isso implicou a borracha, um traço por cima e de seguida o abandono. A acção (ou desacção) de desistência, derramando sobre mim mesmo qualquer linha que tivesse surgido previamente na cabeça, desaparecendo com o meu respirar.

O receio foi responsável. De alguma forma ganhei hesitação na partilha dos pensamentos. Guardei-os em mim, fora de alcance. Por vezes tentei mostrá-los, mas falhei quando me negava automaticamente com a justificação de que teria de ser forte e vivê-los sozinho. Cada vez mais me fechei neste mundo de ideias invisíveis por fora, proibindo-me a mim mesmo de me expressar. “Superei” o escrito. Acções, emoções, falsificação de expressões. Dizer que sim quando penso que não. Fazer algo que considero errado. Expandi os meus limites sem me aperceber deles. E a expansão não tem de ser sempre boa.

De qualquer forma, algo superei. Talvez o cansaço de nada fazer e tudo pensar me tenha feito ganhar coragem de retomar o caminho que construí anteriormente. Não. O caminho que pensei construir, mas que nunca passou do pensar. Certamente… Certamente avancei mais na acção do que antes. Mas certamente… Certamente tenho ainda de recuperar algo que perdi de mim… Algo que faz a minha cara, a minha pessoa. Sem essa minha essência, sem a recuperar, não vale a pena sequer passar ao próximo nível. Também os mundos se constroem por partes.

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